domingo, 5 de agosto de 2007

Princípios do Processo Penal: a busca da verdade real e o direito de não produzir prova contra si mesmo.

Princípios do Processo Penal: a busca da verdade real e o direito de não produzir prova contra si mesmo.

O Processo penal é o meio pelo qual o Estado procede à composição da lide, aplicando o direito no caso concreto e dirimindo os conflitos de interesse. [1]

Indubitável não se configurar o processo penal como um conjunto anárquico de disposições tendentes ao apenamento de um crime. Dita concepção de um processo penal sem freios e travas encontra-se, a olhos nus, divorciada de princípios inerentes ao Estado Democrático de Direito, não se compaginando, doutra banda, com ditames ínsitos ao atual estágio vivenciado pelo direito processual penal. [2]

Para a formalização da lide há necessidade da inserção de elementos subjetivos no processo, os sujeitos processuais trazem seus problemas para a moderna solução de conflitos, a solução estatal. Para dirimir estes conflitos o processo precisa estar calcado em princípios que o orientam, fornecem parâmetros que tem força de lei e como essa deve ser respeitada.

Entre vários princípios destacamos o princípio da busca da verdade real. Mas importa saber o que é verdade real e como diferencia-la das demais espécies de verdade.

A verdade é levantada em sede probatória, regida pelo contraditório e ampla defesa. A colheita desta prova é perante o juízo e deve ser inadmissível a prova obtida por meios ilícitos . (Art 5°, LV e LVI da CF/88)

A doutrina clássica sustenta que o processo penal busca, por intermédio da prova, a "verdade real". De acordo com o Professor Damásio de Jesus

O processo criminal norteia-se pela busca da verdade real, alicerçando-se em regras como a do artigo 156, 2.º parte, do CPP, que retira o Juiz da posição de expectador inerte da produção da prova para conferir-lhe o ônus de determinar diligências ex officio, sempre que necessário para esclarecer ponto relevante do processo. (grifo nosso)

De modo diverso há uma parte da doutrina que sustenta o que se chega ao processo é a verdade formal, que seria a verdade tida como verdadeira, a decorrente das provas produzidas nos autos, segundo as normas processuais.

Embora não faltem afirmações no sentido de que no processo se busca a verdade real, parece evidente que não se pode alcançar senão a verdade formal, porque o juiz não pode fundamentar sua convicção senão de acordo com as provas produzidas nos autos, com observância das regras processuais. Assim, por exemplo, por ilícita, não se admite a tortura, ainda que, através dela, se pudesse chegar à verdade material. [3]

A verdade real está demonstrada código de Processo Penal no art. 156 que prevê que o juízo poderá determinar diligências de oficio para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

Mas a busca da verdade real, não pode ferir garantias constitucionais, entre elas a garantia ao contraditório e a ampla defesa (exemplo clássico é a vedação de apresentar prova no tribunal do júri sem que seja comunicada a parte contrária em três dias), impossibilidade de juntar documento em qualquer momento processual, proibição das provas ilícitas e direito de não produzir prova contra si.

No nosso ordenamento vigora a presunção de não culpabilidade, onde a inocência não necessita ser provada (Art. 5°, LVII, CF/88). A culpa, esta sim, deve ser provada para haver então a ponderação na aplicação da pena.

O réu no processo penal não precisa provar a sua inocência, sendo a acusador o ônus de fornecer os meios probatórios para a condenação do acusado. O silêncio jamais deverá ser interpretado contra o réu, pois este tem o direito de permanecer calado ( art. 5º, LXIII, CF/88.)

O réu não é obrigado, em hipótese alguma, a produzir prova contra si. O direito de não se auto-incriminar é garantido em ao menos três incisos vizinhos no artigo 5º da Constituição Federal: direito à ampla defesa, da presunção da inocência e de permanecer calado. [4]

O mesmo entende o Ministro Gilmar Mendes que entende que o

direito ao silêncio, que assegura a não-produção de prova contra si mesmo, constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da dignidade da pessoa humana. [5]

A tutela do direito da não auto-incriminação não somente protege o direito ao silencio como também proíbe que o réu seja submetido a exames físicos compelido por ordem do juízo. A não realização não pode ser sanada com um simples laudo atestando a possibilidade do réu se achar em alguma situação que poderá trazer gravames.

A busca pela verdade real tem que considerar outra possibilidade par se encontrar a verdade formal, não podemos aceitar em nosso ordenamento provas que ferem garantias constitucionais. A impossibilidade de auto-incriminação traz segurança jurídica e efetiva o estado democrático de direito.



[1] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva 2006.

[2] ARAÚJO, José Osterno Campos de. Verdade real possível no Processo Penal. DireitoNet. Disponível em< http://www.direitonet.com.br/artigos/x/24/59/2459/#perfil_autor>Acesso em 10 julho 2007.

[3] TESHEINER, José Maria. Prova em geral.< http://www.tex.pro.br/wwwroot/curso/proces soseconhecimentoecautelar/provas/provaemgeral.htm> Acesso em 10 julho 2007.

[4] HAIDAR, Rodrigo. Garantia constitucional: TRF-4 cassa decisão que manda réu fazer prova contra si. Revista Consultor Jurídico, 27 de julho de 2005. Disponível em <http://conjur.estadao.com.br//static/text/36631,1> Acesso em 10 julho 2007


[5]
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 91477 MC / BA – BAHIA. MEDIDA CAUTELAR NO HABEAS CORPUS. Relator: Min. Gilmar Mendes. Brasília,
24/05/2007. DJ de 30/05/2007 PP-00026. . Disponível em: <http://www.stf.gov.br/jurisprudencia/nova/pesquisa.asp?s1=%22 prova%20contra%20si%22&d=DESP
>. Acesso em: 11 julho 2007.

Sobre o Autor:

SILVA JUNIOR, Luis Aldair Nunes da. Princípios do Processo Penal: a busca da verdade real e o direito de não produzir prova contra si mesmo. Disponível em www.professoraldair.blogspot.com. Acesso em 05 Ago 07.

IMPUTAÇÃO OBJETIVA.

IMPUTAÇÃO OBJETIVA.

Primeiramente precisamos saber qual a conceituação de crime, para irmos às diversas teorias do crime. Considerando que nosso Código Penal não traz uma definição expressa do conceito de crime, entende-se que em nosso país, o conceito de crime é doutrinário, tendo, contudo surgido vários conceitos, sob aspectos diferentes, tais qual o conceito formal, material e analítico[i].

Crime é um fato típico, antijurídico e culpável, na teoria finalista da ação (diferente da teoria causalista onde culpabilidade - dolo e culpa - não integra o tipo penal) a culpabilidade é elemento da conduta, sendo um dos elementos essenciais do fato típico, e este elemento capital do crime. Não podemos falar de crime sem dolo ou culpa, mas nem sempre foi assim.

Fato típico é um comportamento (ação ou omissão), provocado pelo ser humano, e que está perfeitamente detalhado no tipo penal, delineando com o bem jurídico a ser protegido.

Fato Antijurídico ou ilícito é aquele em que está contrário à lei, ao tipificado na lei penal, ou ainda, o efeito contrário provocado entre a lei e o fato típico praticado. Soma-se a isto o nexo de causalidade entre a ação do agente e o resultado obtido ([1]), com força no artigo 13, caput, in fine do Código Penal [2]: "considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido".

Todo fato típico tende a ser ilícito (teoria indiciária do tipo) e só não será quando presentes as excludentes de ilicitude([3]). O resultado jurídico desta conjugação deve ser abjeto, sendo que é desvalioso quando for ([ii]): (a) imputável objetivamente à conduta do agente (resultado de uma conduta praticada em situação de um risco proibido relevante) ([4]); (b) real ou concreto (princípio da ofensividade: proibição do perigo abstrato). ([iii]); (c) transcendental (afetação de terceiros - princípio da alteralidade); (d) grave (princípio da insignificância ou crimes bagatelares); (e) intolerável (resultados tolerados não são juridicamente relevantes) e (f) objetivamente imputável ao risco criado (imputação objetiva do resultado).

IMPUTAÇÃO OBJETIVA

Roxim[iv] trouxe ao mundo jurídico a imputação objetiva, decorrentes de sua fundamentação de aspectos observados na política criminal, devendo fazer uma analise política antes de sistemática do crime. O crime deve ser valorado conforme a política criminal adotada. Essa forma impossibilita todos os estudos sistemáticos do crime, dizendo que o crime constitui na causa um risco proibido ao objeto jurídico. É essa teoria que surge a teoria da imputação objetiva.

A teoria teve origem no direito grego, mas a sua base teórica se engrandeceu no início deste século. Damásio Jesus[v], ao contrário, sustenta que a teve sua iniciação teórica há sessenta anos.

Na verdade, as bases filósoficas que, efetivamente, dão ensejo à teoria partem de Hegel, com sua filosofia subjetivista. Depois, vamos encontrar campo mais vasto no funcionalismo, tese filosófica/sociológica que se inicia com Durkheim, que dizia que uma sociedade normal deve ter em seu meio o crime, desde que não hajam excessos em quantidade e qualidade[vi].

A evolução nos faz perceber que é forte a tendência dos filósofos nas teorias penais. Direito é uma parte social sendo que a adequação social seria o elemento normativo do tipo. Assim, se de Kant origina-se a Escola Positiva, é de Güther Jakobs e Luhmann que decorre sua visão funcionalista.

Com base em um funcionalismo penal é que se chegou à imputação objetiva, cuja aceitação não é pacífica. Introduzida na Alemanha, passou pela Espanha e alguns países latinos americanos. No Brasil, há uma corrente da doutrina que não aceita tal teoria, mas já há julgados aceitando. Aliás, o cerne da teoria, que o "princípio do incremento do risco", nas palavras do próprio Roxim, "... não se pode dar ainda por concluída". Vê-se a necessidade de um estudo mais aprofundado, mas é de grande valia para o direito penal moderno.

Risco proibido e risco permitido

Riscos permitidos: são condutas atípicas. Todo o desenvolvimento tecnológico moderno trás riscos permitidos. Toda a atividade humana tem perigo de dano. Para Damásio ([5])

Há que consignar-se, entretanto, que o risco permitido (categoria própria da imputação objetiva) não se confunde com a negligência, imprudência ou imperícia (espécies de culpa). Lá, a verificação recai sobre as regras do ordenamento social (apreciação ante factum), dispensando uma análise individualizada (post factum). No risco permitido há uma tolerância genérica de condutas consideradas atípicas ex ante facto e de forma abstrata (conceito formal). Quando, contudo, aprecia-se o comportamento do autor perante a observância ou inobservância do dever objetivo de cuidado, analisa-se o fenômeno social post factum, diante de suas circunstâncias concretas.

Riscos proibidos: produzem um resultado típico, contrário à norma, o perigo desaprovado conduz à tipicidade da conduta culposa ou dolosa.

Esta teoria tenta conjugar teorias já existentes, sendo uma compilação de aprendizagem aprendidas, trazendo as como diferença: a adequação social é elemento normativo do tipo; não falamos mais em resultado natural, já que será sempre caracterizado pelo risco ao objeto jurídico. Dessa forma, desenvolveu-se a distinção entre risco permitido e risco proibido; a conduta só será imputável objetivamente ao agente se houver liame mínimo entre a conduta e o resultado final. Na verdade é a adoção da teoria do incremento do risco

De outro modo, não se atribui objetivamente o resultado na hipótese de ausência do risco do resultado, que inclui as situações em que o autor não cria risco do resultado, ou reduz o risco preexistente de resultado. Um exemplo é alguém, que para evitar que um objeto caia sobre a cabeça de uma pessoa, desvia o objeto e acaba somente lesionado o ombro.



Como bem entende Lívia Nogueira Ramos

Só haverá imputação objetiva quando for possível imputar um resultado a uma pessoa se a ação desta criou um risco juridicamente desaprovado que está refletido no resultado típico. [vii]

Para a autora Claus Roxin criou parâmetros para a determinação do juízo de imputação objetiva: "diminuição do risco; a criação ou não-criação de um risco juridicamente relevante; o incremento ou falta de aumento do risco permitido; o âmbito de proteção da norma e o alcance do tipo".

A teoria da imputação objetiva é aplicável quando não se deve imputar a alguém um resultado lesivo (crime) ao bem jurídico levando-se em consideração somente os fatores primários do tipo impostos pelas teorias já existentes, tendo, contudo, de ser apreciado o risco causado pela ação e o resultado lesivo desta.

Para Roxim[viii] a imputação objetiva verifica-se sob os aspectos objetivos do tipo, sendo que a responsabilização fica sob a prerrogativa do aparecimento de um elemento subjetivo e ainda, sobre os demais requisitos da conduta punível. A teoria recai sobre o aspecto objetivo normativo e não naturalístico, a principal inovação é o incremento da teoria do risco, imputa-se somente ao agente os fatos que realmente contribuiu para o aumento (incremento) do risco juridicamente permitido com derivado propósito de realização deste risco contrário às leis. Com o risco permitido, a imputação objetiva da conduta é excluída, sendo que ainda haverá o afastamento da imputação objetiva quando não houver relação entre o risco ocorrido e o resultado jurídico.


[1] O resultado pode ser naturalístico - aquele que provoca uma transformação no mundo natural - ou normativo-jurídico, que é representado pela violação à norma penal. Nem todo crime depende de um resultado natural.

[2] Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/1980-1988/L7209.htm#art1

[3] Art. 23 Código Penal.

[4] Conduta permitida (exemplos: intervenção cirúrgica autorizada e bem sucedida, lesões esportivas, lesões toleradas etc.) não gera risco proibido. Logo, é atípica (porque típica, agora, só pode ser a conduta que, além de ser adequada à letra da lei, cria ou incrementa um risco proibido).

[5] Op cit item 7.



[i] SILVA, Cleuton Barrachi. Teoria da Imputação Objetiva. Disponível em: Acesso em 07 jul 2007.

[ii] GOMES, Luiz Flávio. Tipicidade material e criação de riscos proibidos . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: . Acesso em: 05 jun. 2007.

[iii] BITENCOURT, César Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, vol 1. 10ª ed. - São Paulo: Ed. Saraiva, 2006.

[iv] ROXIM, Claus. Política criminal e sistema jurídico-penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2000.

[v] JESUS, Damásio Evangelista de. Imputação objetiva. São Paulo: Saraiva, 2000.

[vi] MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Pequeno passeio sobre a imputação objetiva . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 50, abr. 2001. Disponível em: . Acesso em: 05 jun. 2007.

[vii] RAMOS, Lívia Nogueira. IMPUTAÇÃO OBJETIVA E ROXIN. Disponível em http://www.lfg. com.br/public_html/article.php?story=20070605173110829. Acesso em 03 jul 2007.

[viii] ROXIM, Claus. Política Criminal e Sistema Jurídico-Penal. Rio de Janeiro e São Paulo: Ed Renovar, 2000



Citar o autor

SILVA JUNIOR. Luis Aldair Nunes da. Imputação Objetiva. Disponível em www.professoraldair.blogspot.com. Acesso em XX de XX de XXX.

Direitos humanos e tributação

Direitos humanos e tributação


Mário Antônio Lobato de Paiva
advogado em Belém (PA), titular do escritório Paiva Advocacia, professor da Universidade Federal do Pará

Institucionalizada, a partir das lutas antiabsolutistas, no século XVIII, e da expansão dos movimentos constitucionalistas, no século XIX, a democracia representativa foi consolidada ao longo de um processo histórico marcado pelo reconhecimento de três gerações de direitos humanos: os relativos à cidadania civil e política, os relativos à cidadania social e econômica e os relativos à cidadania "pós-material", que se caracterizam pelo direito à qualidade de vida, a um meio ambiente saudável, à tutela dos interesses difusos e ao reconhecimento da diferença e da subjetividade.

Todas essas três gerações de direitos humanos gravitam em torno do Estado. A primeira, por representar uma conquista dos cidadãos contra o despotismo governamental, procura enquadrá-lo por meio da promulgação de uma ordem constitucional asseguradora das garantias fundamentais e das liberdades públicas.

Já a segunda, encarando o Estado como instrumento de mediação e neutralização dos conflitos coletivos, requer sua atuação na regulação dos mercados, na indução da demanda, na proteção trabalhista e na implementação de políticas de renda no âmbito da sociedade.

A terceira geração de direitos humanos pressupõe o fortalecimento das prerrogativas e do poder de iniciativa das instituições encarregadas de promover a proteção do patrimônio histórico, cultural e ambiental e o reconhecimento dos interesses "pós-materiais". A cada geração dos direitos humanos, um dos poderes do Estado é destacado. Enquanto os direitos humanos de primeira geração dependem do Legislativo e do Judiciário, por terem sido forjados como forma de proteção contra o poder do Estado, os direitos humanos de segunda e terceira geração exigem, para sua concretização, uma atuação positiva do Executivo. As três gerações de direitos humano enfrentam problemas para serem efetivadas. Seus valores básicos - liberdades públicas, igualdade substantiva e afirmação dos interesses "pós-materiais" - colidem com os imperativos categóricos da transnacionalização dos mercados, como a ênfase na produtividade, na competitividade e na liberdade de circulação dos capitais. O cálculo econômico e a "razão produtiva", em outras palavras, revelam-se potencialmente incompatíveis com os princípios básicos de convivência e sociabilidade no âmbito de padrões organizacionais e de formas institucionais dotadas de um mínimo de legitimidade jurídica e equilíbrio social.

Como no choque entre as panelas de ferro e de barro sempre quebra a mais fraca, não é difícil identificar as conseqüências dessa colisão. Na medida em que a dinâmica da acumulação privada e a mobilidade dos capitais já não são controladas pelo Estado, através da tributação, os direitos humanos, numa visão jurídico-positiva, encontram- se em fase regressiva. Eles podem até continuar existindo no plano legal, sobrevivendo, em termos formais, aos processos de tributação. Mas não têm mais condições de serem efetivamente implementados no plano real (se é que o foram, integralmente, um dia). E quando isso eventualmente ocorre, sua aplicação tende a ser seletiva. Entre outros motivos, porque muitas decisões jurídicas não são mais implementadas por atos de autoridade capazes de suscitar obediência, dependendo, ao contrário, de negociações entre decisores e destinatários para ser eficazes. Nesse cenário, cada vez mais, as decisões impositivas não são as relativas aos direitos humanos, porém, as destinadas a neutralizar os efeitos perversos da tributação na vida social.

Com o avanço da tributação, está aprofundando-se a desigualdade e a exclusão, uma vez que os ganhos de produtividade em grande parte têm sido obtidos à custa dentre outros da sonegação tributária, revelando a simbiose entre marginalidade econômica e marginalidade social, obrigando as instituições jurídicas do Estado a concentrar sua atuação na preservação da ordem e da segurança.

Com a sonegação, os excluídos dos mercados de trabalho perdem as condições materiais para exercer em toda a sua plenitude os direitos humanos de primeira geração e para exigir o cumprimento dos direitos humanos de segunda e terceira gerações. Condenados à marginalidade socio-econômica e, por conseqüência, a condições hobbesianas de vida, eles não mais aparecem como portadores de direitos subjetivos públicos. Nem por isso, contudo, são dispensados das obrigações estabelecidas pela legislação, especialmente, em matéria criminal.

Diante da ampliação dos bolsões de miséria nos centros urbanos, da expansão da criminalidade e da propensão à desobediência coletiva, as instituições jurídicas e judiciais do Estado, antes voltadas para o desafio de proteger os direitos civis e políticos e de conferir eficácia aos direitos sociais e econômicos, acabam agora tendendo a assumir papéis eminentemente punitivo-repressivos. Para tanto, o Direito Penal tem sido alterado radicalmente, numa dimensão mais severa. Por isso, enquanto no âmbito dos direitos sociais e econômicos se vive, hoje, um período de refluxo, no Direito Penal a situação é oposta. O que aí se tem é a definição de novos tipos penais, a criminalização de novas atividades em inúmeros setores na vida social, o enfraquecimento dos princípios da legalidade e da tipicidade por meio do recurso a regras sem conceitos precisos, o encurtamento das fases de investigação criminal e instrução processual e a inversão do ônus da prova.

Fazendo uma analogia, isso equivaleria mais ou menos a que, havendo na sociedade um elevado índice de criminalidade, agravado pela impunidade, se decidisse por encarcerar, durante um mês por ano, todos os cidadãos, independentemente de terem cometido delito ou não, pois assim estaríamos com certeza "punindo" os infratores. Ou seja, estaríamos cometendo uma enorme injustiça com os cidadãos honestos e premiando os delinqüentes com uma pena bastante leve, ferindo gravemente os direitos humanos . É mais ou menos o que ocorre com a CPMF.

Do ponto de vista da economia internacional J.A. Lindgren Alves assevera interesses opostos entre as nações uma vez que os países ricos utilizam os direitos humanos como argumento adicional de condicionalidade à assistência e à cooperação econômica ao Terceiro Mundo; os países em desenvolvimento , buscam obter assistência e cooperação econômica para que possam ter meios de assegurar os direitos humanos de sua populações.

Celso Lafer, no prefácio, diz que no Brasil de hoje , a violação dos direitos humanos não têm como fulcro e foco o arbítrio discricionário do poder concentrado e centralizado de um regime autoritário, mas sim as dificuldades de um regime democrático de assegurar, num país continental e numa sociedade heterogênea , permeada de diversas desigualdades, o efetivo respeito aos direitos humanos.

Diante disso, a solução passa, necessariamente, pelo sistema tributário brasileiro, que, fundamentalmente, desconsidera de forma dramática as mudanças radicais por que o mundo vem passando nas últimas duas décadas. Ele já não mais atende aos anseios e objetivos sociais, atualmente, apesar de ter sido um grande avanço quando foi criado, e a despeito do insanável vício de legitimidade com que foi imposto ao País, em tempos de ditadura.

Não serve à sua tarefa óbvia de financiar o setor público com eficácia - isso está visto pelo descalabro das contas públicas, pela precariedade da infra-estrutura, pelo colapso do serviço público. Mas também não serve em outros planos de valores estratégicos como a interação entre o Estado e a economia ou, no que pertence ao pacto federativo, em frangalhos, que testemunhamos com as acusações de guerra fiscal, jogando brasileiros contra brasileiros, e cevando absurdo ressentimento recíproco entre São Paulo e o resto do Brasil, dando, como exemplo, a concentração de renda que é um problema crônico no Brasil, onde 10% da população detém cerca de 50% da renda nacional seria utópico exigir a reversão desse quadro no curto prazo. No entanto, essa não pode ser uma tarefa eternamente adiada sine die. É preciso estabelecer-se políticas públicas, em que a questão seja contemplada como meta a ser atingida. Os elevados juros reais que, juntamente com a âncora cambial, são os pilares da estabilização brasileira e têm um significativo efeito concentrador de renda

A carga sobre os contribuintes tem sido crescente ao longo dos últimos anos e chegou a 31% do PIB. Não obstante, a qualidade dos serviços públicos não melhorou e, em alguns casos, deteriorou-se.

Mas como nasce o tributo ?

Segundo Ricardo Lobo Torres o tributo nasce no espaço aberto pela auto limitação da Liberdade , o que equivale a dizer que vive permanentemente limitado pela liberdade individual, que lhe é pré-existente. Assevera também, que as idéias de liberdade e tributo e de direitos humanos e poder de tributar ligam-se essencialmente na mesma equação de valores e se encontram em permanente interação, sendo que a legitimidade do poder tributário se afirma pelo respeito aos direitos da liberdade e pela utilização dos princípios constitucionais vinculados à segurança, a justiça e à igualdade, diz ainda que as imunidades fiscais são limitações ao poder de tributar fundadas na liberdade absoluta sendo as imunidades tributárias tão indefeiníveis, como os próprios direitos da liberdade, as discriminações fiscais são desigualdades infundadas que prejudicam a liberdade do contribuinte. Porém se perceptível qualquer discriminação injustificável que implique excluir alguém da regra tributária geral ou de um privilégio não odioso, constituirá ofensa aos seus direitos humanos, posto que desrespeitará a igualdade assegurada no art 5º da CF.

Esta reflexão busca contribuir para um debate central no momento em que se discute, de um lado, a necessidade de profunda redistribuição da carga tributária entre os diferentes segmentos da sociedade; e, de outro, a escassez de recursos financeiros que possibilitem o enfrentamento da dura realidade sócio- econômica brasileira, em que distorções e desequilíbrios representam grave ameaça à estabilidade política.

Tamanho excesso da tributação sobre o consumo traz diversos efeitos nocivos que legitimamente a sociedade contesta. Essa disfunção é característica da tributação indireta, onde o contribuinte de fato - indireto - arca com o ônus tributário, independentemente de sua capacidade tributiva e, com isso, há um efeito regressivo, que leva a uma contribuição equivalente de partes desiguais - quem pode menos e quem é capaz de contribuir com mais.

Por incidirem sobre a atividade produtiva, tais tributos aumentam o já odioso "Custo Brasil" e oneram sobremaneira a atividade produtiva, que gera e distribui riqueza e empregos (bem-estar social). Exigem controles complexos (pois envolvem toda a cadeia produtiva) e, por isso, representam um terreno fecundo para a sonegação, a qual, de um lado, é um forte mecanismo de concentração de riqueza e, de outro, desmoraliza o fisco e o sentimento de cidadania frente ao sistema tributário. Tal situação tem levado a índices de evasão fiscal da ordem de 50%.

Segundo Jose Luiz Quadros de Magalhães em uma ordem jurídica onde estes direitos humanos são colocados como princípios fundamentais e objetivo do Estado , a ideologia constitucionalmente adotada aponta na direção de um Estado que proporcione o bem estar social , oferecendo e respeitando os Direitos Sociais e individuais , atrás de uma política econômica que valoriza em primeiro lugar estes objetivos sociais.

Posta a discussão numa dimensão estritamente jurídico-positiva, portanto, as condições atuais para a efetividade dos direitos humanos com o excesso de tributação parecem nebulosas. Esse ceticismo, porém, não deve ser entendido como desqualificação das lutas pelo reconhecimento dos direitos humanos, por considerá-las inviáveis a "priori". Encarados numa perspectiva menos jurídica e mais política, os direitos humanos podem propiciar poucos resultados concretos a curto prazo, mas, certamente, transformadores a médio e longo prazos.

Diante disso, a solução passa, necessariamente, pelos seguintes pontos: Uma reforma tributária que revise a estrutura de impostos e, ao mesmo tempo, torne-a mais justa, mais simples e propiciando maior competitividade à economia (por exemplo, destributando as exportações). O combate à sonegação e à corrupção (também a passiva), no sentido de garantir a cobrança dos impostos e a remoção de óbices estruturais ainda fortemente presentes na nossa economia, como a arcaica estrutura tributária é condição sine qua non. Tudo que agrave o sistema hoje já distorcido e não mude essa estrutura estará adiando o desenvolvimento e o respeito aos direitos humanos, embora possa, superficialmente, representar uma solução simples.



Sobre o autor:
Mário Antônio Lobato de Paiva é membro da Union Internationale des Avocats (Paris, França), da Federação Iberoamericana de Associações de Direito e Informática, da Associação de Direito e Informática do Chile, do Instituto Brasileiro de Política e Direito da Informática e do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico. É também assessor da Organização Mundial de Direito e Informática (OMDI), integrante de la Red Mexicana de Investigadores del Mercado Laboral, colaborador da Revista do Instituto Goiano de Direito do Trabalho, Revista Forense, do Instituto de Ciências Jurídicas do Sudeste Goiano e Revista de Jurisprudência Trabalhista "Justiça do Trabalho", da Revista Síntese Trabalhista, do Boletim Latino-americano da Concorrência. Escreveu diversos artigos e os livros "A Lei dos Juizados Especiais Criminais" (Forense, 1999) e "A Supremacia do advogado em face do jus postulandi" (LED, 2000).
E-mail: Entre em contato
Site: www.netcie.com.br/advocacia
Sobre o texto:
Texto inserido no Jus Navigandi nº 22 (12.1997).
Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
PAIVA, Mário Antônio Lobato de. Direitos humanos e tributação . Jus Navigandi, Teresina, ano 2, n. 22, dez. 1997. Disponível em: . Acesso em: 05 ago. 2007.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Notícias publicadas no dia 02/08/2007, quinta-feira

Notícias publicadas no dia 02/08/2007, quinta-feira.


As seguintes notícias foram publicadas no sítio do STF na data de 02/08/2007, quinta-feira:


20:14 - Plenário confirma inconstitucionalidade de artigo da Constituição capixaba
19:57 - Servidores públicos aposentados em São Paulo têm direito a receber prêmio de produtividade
19:50 - Plenário nega provimento a agravo regimental sobre cobrança da Cofins
19:30 - Presos na “Operação Furacão” pedem para responder a processo em liberdade
19:06 - Constituição de 1988 é tema de programa especial na Rádio Justiça nesta sexta-feira (3)
18:50 - Contec propõe ADI contra inclusão das empresas de limpeza no Simples
18:47 - Ministros aprovam proposta de orçamento do STF para 2008
18:14 - Suspenso julgamento sobre procedimento de controle administrativo de Ali Mazloum no CNJ
17:20 - Publicada no DJ decisão que arquiva inquérito que investigava Henrique Meirelles
16:43 - Supremo declara inconstitucional lei gaúcha sobre limite de idade para inscrição em concursos públicos
16:10 - Plenário suspende artigo da Constituição sobre contratações de servidores públicos (atualizada)
15:51 - Cassados dispositivos de lei catarinense sobre sistema de ensino
15:48 - Suspensa liminar que determinava a nomeação de candidato à Polícia Civil no Ceará
14:20 - TV Justiça passa a ser sintonizada no canal 117 pelos assinantes da Sky
11:39 - Primeira sessão administrativa do semestre acontece nesta quinta-feira (2)
08:35 - Pauta de julgamentos previstos para esta quinta-feira (2), no Plenário
08:20 - Ação contra portaria sobre classificação indicativa de programas de TV é arquivada

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

RESENHA DIÁRIA DE JULHO DE 2007

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Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

RESENHA DIÁRIA DE JULHO DE 2007

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Atualizado em 31.7.2007

Data de Publicação no D.O.U.

Atos Publicados

31 de julho 2007

Decreto nº 6.173, de 30.7.2007 - Amplia os valores constantes da Reserva do Anexo I e da alínea “b” do inciso I do art. 10 e altera os Anexos VIII, IX, X e XI do Decreto no 6.046, de 22 de fevereiro de 2007, que dispõe sobre a programação orçamentária e financeira, estabelece o cronograma mensal de desembolso do Poder Executivo para o exercício de 2007, e dá outras providências.

Decreto nº 6.172, de 30.7.2007 - Autoriza o aumento do capital da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia – HEMOBRÁS.

Decreto nº 6.171, de 30.7.2007 - Dispõe sobre a Medalha-Prêmio “Almirante Alexandrino de Alencar” e dá outras providências.

Decreto de 30.7.2007 - Autoriza o aumento do capital social da Companhia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU.

Decreto de 30.7.2007 - Abre ao Orçamento de Investimento para 2007, em favor da Caixa Econômica Federal - CEF, crédito suplementar no valor total de R$ 27.843.104,00, para os fins que especifica.

Decreto de 30.7.2007 - Abre ao Orçamento Fiscal da União, em favor de Transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, crédito suplementar no valor de R$ 83.277.716,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.

Decreto de 30.7.2007 - Abre ao Orçamento da Seguridade Social da União, em favor dos Ministérios da Previdência Social e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, crédito suplementar no valor global de R$ 87.932.909,00, para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente.