quarta-feira, 30 de abril de 2008

Protegido pela Lei nº 9.610, de 19/02/1998 - Lei de Direitos Autorais


Texto confeccionado por
(1) Luiz Cláudio Barreto Silva
Atuações e qualificações
(1) Advogado, escritor, pós-graduado em Direito do Trabalho e Legislação Social, ex-Diretor Geral da Escola Superior de Advocacia da 12ª Subseção de Campos dos Goytacazes e Professor Universitário.

BANCOS: SER OU NÃO SER FORNECEDOR, EIS A QUESTÃO

I. Considerações iniciais

As instituições financeiras e bancos (1) estão submissos aos comandos da legislação consumeristas. Esse foi, em outras palavras, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal. Com ele, a recalcitrância desses fornecedores que atuam no Sistema Financeiro em fugir às referidas regras, espera-se, não mais se justifica.

II. O posicionamento da doutrina

A doutrina especializada já acenara, desde os idos tempos, com essa submissão dos bancos e instituições financeiras ao CDC, e sem os limites que, sem sucesso, essas entidades tentaram impor.

Nessa linha de entendimento, as antigas considerações Arnaldo Rizzardo, mas sempre com o sabor de novas:

“Não há dúvida quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, introduzido pela Lei 8.078, de 11.09.1990, aos contratos bancários. Como é bastante comum, as entidades financeiras, cuja mercadoria é a moeda, usam nas suas atividades negociais uma série de contratos, em geral de adesão, a eles aderindo aqueles que necessitam de crédito para as suas atividades. Proliferam as cláusulas abusivas e leoninas, previamente estabelecidas, imodificáveis e indiscutíveis quando da assinatura dos contratos”. (2)

III. O posicionamento do Superior Tribunal de Justiça

A matéria em debate, a despeito da costumeira resistência desses fornecedores em negar sua condição e submissão ao CDC, já era surrada no Superior Tribunal de Justiça. Naquela Corte, uma vez cristalizado o entendimento, foi editada a Súmula n. 297, com o seguinte enunciado: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.(3)

IV. O questionamento da matéria no Supremo Tribunal Federal

Insatisfeitos, os bancos e instituições financeiras, por meio da Consif, questionaram, pela via do controle direto (4), a constitucionalidade da legislação consumerista (5) , alegando, dentre outros argumentos, a existência de vício formal. É que, de acordo com a tese defendida na ação de inconstitucionalidade, o Código de Proteção ao Consumidor foi criado por intermédio de lei ordinária, porém a matéria deveria ser disciplinada por lei complementar.

IV.1. O posicionamento doutrinário com relação a ADI n. 2591

Com relação ao tema, em artigo elaborado antes do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, mas pugnando pelo resultado favorável aos consumidores, sem desmerecer, contudo, o posicionamento dos notáveis juristas Ives Gandra da Silva Martins, Arnoldo Wald e Fátima Fernandes Rodrigues de Souza, que adotavam posicionamento diverso, Flori Antonio Tasca, com acerto, já asseverava que:

“Mesmo após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter editado o Verbete n° 297 de sua Súmula de Jurisprudência Predominante - “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras” -, essas instituições resistem aos ditames da Lei n° 8.078, de 15/09/1990, o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

No último “round” da luta das instituições financeiras contra o CDC, a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) n° 2.591, na tentativa de excluir as relações dos bancos e seguradoras com seus clientes da aplicação do CDC”.

(...).

A manobra das instituições financeiras, com o ajuizamento da indigitada Adin, é perniciosa (maléfica mesmo), pois o “CDCB”, além de ignorar importantes direitos consagrados pelo CDC, ainda dá azo a que as casas bancárias sequer cumpram seus ditames. Explica-se: é comum em ações judiciais contra instituições financeiras a alegação pela qual “resolução não tem força de lei”, como justificativa para o não cumprimento de normas emanadas do Bacen.

Isso ocorreu, por exemplo, em processos nos quais se discutia a responsabilidade civil de bancos decorrente de prejuízos sofridos por quem recebeu cheques de contas encerradas, nos termos da Resolução n° 2.025 (24/11/1993) do Bacen.

(...).

É preciso reagir contra tal situação, pois a sociedade não merece sofrer mais esse golpe aplicado pelas instituições financeiras. Cabe ao Poder Judiciário, nomeadamente ao STF enquanto guardião da Constituição da República, repelir a pretensão da Consif, reconhecendo a aplicabilidade plena e irrestrita do CDC às instituições financeiras, como já o fez o STJ reiteradas vezes, consolidando o entendimento pela Súmula n° 297”.(6)

Sobre a importância do julgamento, levando em conta o número de ações revisionais ajuizadas em face das referidas instituições e bancos, a manifestação de Jansen Fialho de Almeida:

“O Supremo Tribunal Federal está na iminência de julgar ADI proposta pelos bancos que visam não lhes ser aplicável às regras do Código de Defesa do Consumidor, sob o fundamento de que só podem ser regidos por leis complementares (artigo 192, CF).

Cuida-se de momento ímpar na história do Direito brasileiro, aliás, premente, devido ao ajuizamento milhares de ações revisionais que desaguaram nos tribunais. De vital importância um posicionamento definitivo, inclusive quanto à limitação ou não dos juros reais nas relações de consumo”. (7)

Na mesma linha, em trabalho publicado após a decisão do STF, as considerações de Daniella Augusto Thomaz:

“Uma longa e complicada batalha jurídica entre bancos e consumidores teve seu desfecho na sessão plena do STF. E dessa vez o Supremo decidiu em favor dos consumidores. O julgamento envolveu a ADIN dos bancos, ajuizada em abril de 2002 pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras, com o objetivo de ter a atividade bancária excluída do rol de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, CDC. A questão, embora já decidida pelo STJ, que havia editado a Súmula 297 desde setembro de 2004, aguardava desfecho, que só aconteceu com a manifestação do STF.

(...).

O resultado, 9 votos a 2, pela improcedência da ação, resulta numa decisão que protege o objetivo traçado pelo constituinte, de proteção do bem comum da sociedade, com a sobreposição deste quando confrontado com os interesses das instituições financeiras”. (8)

V. O posicionamento do Supremo Tribunal Federal

O Supremo Tribunal Federal, ao contrário do que imaginavam as mencionadas entidades, deu à causa a adequada solução. Entendeu que as “Instituições financeiras se submetem sim às regras do Código de Defesa do Consumidor”, como se extrai de trecho do noticiário daquela Corte sobre o julgamento:

“As relações de consumo de natureza bancária ou financeira devem ser protegidas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC)". Esse foi o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) que, por maioria, (nove votos a dois) julgou improcedente o pedido formulado pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras (Consif) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2591.

A entidade pedia a inconstitucionalidade do parágrafo 2º do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) na parte em que inclui, no conceito de serviço abrangido pelas relações de consumo, as atividades de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária.

O julgamento havia sido adiado no início de maio em razão do pedido de vista do ministro Cezar Peluso que hoje (07/06) seguiu a divergência aberta pelo ministro Néri da Silveira (aposentado) e julgou improcedente a ação.

Cezar Peluso afirmou que o CDC não veio para regular as relações entre as instituições do Sistema Financeiro Nacional e os clientes sob o ângulo estritamente financeiro, mas sim para dispor sobre as relações de consumo entre bancos e clientes. Nesse sentido o ministro argumentou que “não há como nem por onde sustentar, convincentemente, que o CDC teria derrogado, de forma inconstitucional a Lei nº. 4.595/64 [norma sobre o sistema financeiro]”.

Em seguida votou o ministro Marco Aurélio que também acompanhou a divergência. Marco Aurélio afirmou que o CDC não representa nenhum risco ao Sistema Financeiro Nacional (SFN) e destacou a crescente lucratividade dos estabelecimentos bancários para afastar o pensamento de que o CDC repercutiu de forma danosa em relação aos bancos.

Celso de Mello seguiu o entendimento da maioria pela improcedência do pedido na ação e ressaltou que a proteção ao consumidor qualifica-se como valor constitucional. Para o ministro, as atividades econômicas estão sujeitas à ação de fiscalização e normativa do Poder Público, pois o Estado é agente regulador da atividade negocial e tem o dever de evitar práticas abusivas por parte das instituições bancárias.

Nesse sentido, Celso de Mello entende que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) cumpre esse papel ao regulamentar as relações de consumo entre bancos e clientes. O ministro acrescentou que o Sistema Financeiro Nacional (SFN) sujeita-se ao princípio constitucional de defesa do consumidor e que o CDC limita-se a proteger e defender o consumidor "o que não implica interferência no SFN". Assim, concluiu que as regras do CDC aplicam-se às atividades bancárias.

A última a votar, a presidente do STF, ministra Ellen Gracie, também entendeu que as relações de consumo nas atividades bancárias devem ser protegidas pelo CDC. O placar do julgamento definitivo da ADI ficou assim: votaram pela improcedência do pedido formulado pela Consif os ministros Néri da Silveira (aposentado), Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Sepúlveda Pertence, Cezar Peluso, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ellen Gracie. Ficaram parcialmente vencidos os ministros Carlos Velloso (aposentado), relator, e Nelson Jobim (aposentado)”. (9)

VI. Considerações finais

Pelo exposto, não é difícil de se concluir que a decisão do Supremo Tribunal Federal, reconhecendo que a relação entre cliente e banco ou instituição financeira deve ser disciplinada pelo Código de Proteção ao Consumidor, corrobora o entendimento já esposado pela doutrina e por farta jurisprudência, principalmente do Superior Tribunal de Justiça, que cristalizou a matéria por meio de Súmula. Por isso, a provável persistência dessas entidades em negar a sua condição de fornecedores, deve ser reprimida em temperatura alta pelo Poder Judiciário, pois o tema não comporta maiores debates após o histórico pronunciamento do Supremo Tribunal Federal.

NOTAS:

1. Existe distinção entre banco e instituição financeira. “Às expressões ´instituição financeira´ e ´banco´ não são coextensivas, mostrando-se equivocado tomar-se uma pela outra”. (Cfe. ALVES, Vilson Rodrigues. Responsabilidade Civil dos Estabelecimentos Bancários. Campinas: Bookseller, 1997, p. 63).

2. RIZZARDO, Arnaldo. Contrato de Crédito Bancário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 24 (Negritou-se).

3. Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Súmula n. 297. Disponível em: http://www.stj.gov.br/SCON/sumulas/toc.jsp?livre=@docn . Acesso em: 10 jun.2006.

4. ADI n. 2591.

5. Art. 2º e 3º, da Lei 8078/90 (CDC).

6. TASCA, Flori Antonio. As Instituições Financeiras e a Tutela dos consumidores. Consulex.net. Disponível em: http://www.consulex.com.br/consulexnet_read.asp?id=1&idd=2675 Acesso em: 23 jun.2006.

7. ALMEIDA, Jansen Fialho de. STF – Bancos x Consumidores. Disponívem em: https://www.consulex.com.br/art_read.asp?id=28 Acesso em: 2 jul.2006.

8. THOMAZ, Daniella Augusto. CDC e bancos, uma vitória do cliente. Acesso em: 2 jul.2006.

9. Instituições financeiras se submetem às regras do Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/ultimas/ler.asp?CODIGO=197007&tip=UN&param= . Acesso em: 10. jun.2006.

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